9 de mar. de 2018

Poesia de Jose Antonio dos Santos (Zeca) - O Chico nosso de cada dia


Fonte - pt.depositphotos.com

O CHICO NOSSO DE CADA DIA

                                      ( Ao meu amigo Luiz Paulo a quem devo a mais linda aula de minha vida)

Eu pus a minha mão no rio
E senti  em sua água morna
Aquela dor que entorna
De um peito que não é seu.

Eu pus os meus pés no rio
E senti um calafrio
Quando  me falou das secas
Quando me falou das cercas
Que guardam o povo seu.

Eu olhei pro  fundo do rio
E ouvi suas palavras
Que me falavam das lavras
E de pequenos roçados
E de gente  e  de terra e gado
Que bebiam o pranto seu.

Fiquei de pé na beira do rio.
E me mostrou a imensidão
Que  carrega na solidão
Pelo imenso caminho seu.

Eu me curvei sobre o rio
Para lhe dar acalanto,
Mas eu  ouvi  no murmurejo
Que por ter  nome de santo
É que estende  o seu manto
 E perdoa  as agruras
 Que por não ter candura
 Lhe açoitam os filhos seus.

Caminhei à beira do rio...
Ele me falou das barrancas,
Das gargantas e das pedras,
Das quedas e corredeiras,
Das mulheres lavadeiras
Que cruzam os caminhos seus.

Falou dos barcos festejantes
Que com pobres navegantes
Dormem lá no fundo seu;
Dos pesqueiros e crianças,
Dos mascates e congadas,
Dos reisados e ajumentados,
Dos turistas e oportunistas,

Dos padres  e dos bispos
Que ele já fizera o translado
Levando de lado a lado
Sem receber um obrigado
Por servir extenuado
Tais  desejos dos filhos seus.

  
Deixei meu pranto cair no rio...
E ele com mão dolente
acolheu o pranto meu...
Falou que já se ia
Mas que se morresse  um dia
Que eu  não chorasse assim...

Quando olhasse  pro seu leito
Coberto de mato e lamúrias
Que eu então chorasse  os
preceitos                                                                                                                    
que  eu chorasse  os malfeitos
do mundo em que não intervim.

E como a tarde caía,
me disse que já lá ia
Cumprindo a sua missão
Como o tal santo fazia:
A de Acolher em seu regaço,
A de  Carregar em seus braços
Os  filhos de sua abadia.

Um nó me apertou a garganta;
Pus meus dedos em sua manta...
E meu coração chorou na beira do rio.
                                                                                             Jose Antonio dos Santos (Zeca)
Juiz de Fora , 22 de março de 2016


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